Se Euclides sabia, então você certamente também sabe que
Existe uma infinidade de números primos.
O primeiro a provar esta afirmação foi Euclides (figura abaixo). Eis a sua prova:
Prova 1. (Euclides) Suponha que há somente uma quantidade finita de primos. Temos, então, todos os k números primos p_1 = 2, p_2=3,\ldots,p_k. Considere o inteiro P = p_1 p_2 \cdots p_k + 1. Seja p um divisor primo de P. Então p deve ser igual a algum p_r. Mas então p é um divisor de P e do produto p_1 p_2 \cdots p_k, logo é um divisor da diferença destes dois números P - p_1 p_2 \cdots p_k = 1. Um absurdo. Portanto deve haver uma quantidade infinita de números primos. \square
Neste post, veremos várias outras provas tão memoráveis quanto àquela de Euclides. Tem para todos os gostos. Espero que tomem alguma como sua favorita.
Uma tão elementar quanto a de Euclides:
Prova 2. (Métrod) Suponha a existência de somente k números primos p_1 < p_2 <\cdots < p_k. Seja N = p_1 \cdots p_k. Para cada i =1,\ldots,k, considere Q_i = N/p_i. Observe que p_i não divide Q_i, mas divide Q_j, para j\neq i. Seja
S = \sum_{j=1}^{k} Q_j .
Ora, existe um primo p divisor de S e devemos ter p = p_i, para algum i \in\{1,\ldots,k\}. Mas como p_i divide cada um dos Q_j, para j\neq i, então p_i divide Q_i, pois
p_i \Big| \left( S - \sum_{j\neq i} Q_j \right) \Leftrightarrow p_i | Q_i.
Uma contradição. \square
Uma extravagante; a minha favorita:
Prova 3. (Mixon) Suponha que exista um total de n primos p_1=2,p_2,\ldots,p_n. Tome k suficientemente grande tal que 2^{k} > (k+1)^{n}.
Considere a seguinte função f:\{1,\ldots,2^{k}\} \longrightarrow \{0,\ldots,k\}^{n} definida por f(x) := (e_1,\ldots,e_n), onde x = {p_1}^{e_1} {p_2}^{e_2} \cdots {p_n}^{e_n}. Observe que pelo teorema fundamental da aritmética, a função está bem definida, exceto pelo fato ainda não garantido de que f(x) \in \{0,\ldots,k\}^{n}. Vejamos porque isto é verdade. Uma vez que x \leq 2^k, temos que
k = \log(2^{k}) \geq \log(x) = e_1 \log(p_1) + e_2 \log(p_2) + \cdots + e_n\log(p_n)
\geq e_1 + e_2 +\cdots + e_n \geq \max\{e_1,\ldots,e_n\},
onde o logaritmo acima é tomado na base 2. Logo f(x) \in \{0,\ldots,k\}^{n}. Por fim, o teorema fundamental da aritmética também garante que f é injetiva. Mas isto induz uma contradição, pois f é uma função injetiva de um conjunto de cardinalidade 2^k em um conjunto de cardinalidade (k+1)^n, o que implica em 2^k \leq (k+1)^n. \square
onde o logaritmo acima é tomado na base 2. Logo f(x) \in \{0,\ldots,k\}^{n}. Por fim, o teorema fundamental da aritmética também garante que f é injetiva. Mas isto induz uma contradição, pois f é uma função injetiva de um conjunto de cardinalidade 2^k em um conjunto de cardinalidade (k+1)^n, o que implica em 2^k \leq (k+1)^n. \square
Uma algébrica:
Prova 4. (?) Dado um primo p, mostraremos a existência de outro primo q maior do que p. Considere n = 2^{p}-1 e seja q um fator primo de n. Ora, como q|2^{p}-1, temos que 2^{p} \equiv 1\;(\mathrm{mod}\;q). E uma vez que p é primo, segue que 2 possui ordem p no grupo multiplicativo \mathbb{Z}_{q}^{\ast}. Agora o teorema de Lagrange garante que a ordem de um elemento de um grupo divide a ordem do grupo; portanto p|(q-1), logo q>p. \square
Uma clássica; analítica:
Prova 5. (Euler) Esta prova se baseia na famosa identidade de Euler:
\sum_{n=1}^{\infty} \frac{1}{n} = \prod_{i=1}^{\infty}\left( \sum_{k=0}^{\infty} \frac{1}{p_{i}^{k}} \right),
onde p_i é o i-ésimo primo.
Suponha que tenhamos apenas um número finito de primos 2 = p_1< p_2 < \cdots < p_r. Então a identidade de Euler toma a forma
\sum_{n=1}^{\infty} \frac{1}{n} = \prod_{i=1}^{r}\left( \sum_{k=0}^{\infty} \frac{1}{p_{i}^{k}} \right).
Agora a série \sum \frac{1}{p_{i}^{k}} converge, pois trata-se de uma série geométrica. A saber, vale que
\sum_{k=0}^{\infty} \frac{1}{p_{i}^{k}} = \frac{1}{1-p_i^{-1}}.
Voltando para a identidade de Euler, temos
\sum_{n=1}^{\infty} \frac{1}{n} = \prod_{i=1}^{r}\left( \sum_{k=0}^{\infty} \frac{1}{p_{i}^{k}} \right) = \prod_{i=1}^{r}\frac{1}{1-p_i^{-1}} < +\infty.
Portanto a série harmônica converge. O que é um absurdo. \square
Uma combinatória:
Prova 6. (Pinasco) Suponha existência de apenas uma quantidade finitas de números primos 2=p_1 < \cdots < p_N. Para x\geq1 dado, e para i = 1,\ldots,N, seja A_i o conjunto dos inteiros em [1,x] que são múltiplos de p_i. E seja A o conjunto dos inteiros em [1,x] que são múltiplos de algum primo. Devemos ter A = \cup A_i e A = \{1,\ldots,\lfloor x \rfloor\}, portanto |A| = \lfloor x \rfloor. Pelo princípio da inclusão-exclusão, temos
\left| \bigcup_{i} A_i \right| = \sum_{i=1}^{N} |A_i| - \sum_{i < j} |A_i \cap A_j| + \sum_{i<j<k} |A_i \cap A_j \cap A_k| - \cdots + (-1)^{N+1}|A_1\cap \cdots \cap A_N|.
Portanto,
\left| \bigcup_{i} A_i \right| = \sum_{i=1}^{N} |A_i| - \sum_{i < j} |A_i \cap A_j| + \sum_{i<j<k} |A_i \cap A_j \cap A_k| - \cdots + (-1)^{N+1}|A_1\cap \cdots \cap A_N|.
Portanto,
\lfloor x \rfloor= \sum_{i} \Big\lfloor\frac{x}{p_i} \Big\rfloor - \sum_{i < j} \Big\lfloor\frac{x}{p_i p_j} \Big\rfloor + \sum_{i<j<k}\Big\lfloor\frac{x}{p_i p_j p_k} \Big\rfloor - \cdots + (-1)^{N+1}\Big\lfloor\frac{x}{p_1 \cdots p_N} \Big\rfloor.
Uma vez que \lim_{x\to\infty} \frac{1}{x} \Big\lfloor \frac{x}{t}\Big\rfloor = \frac{1}{t}, temos que, dividindo a penúltima expressão por x e tomando x \to\infty,
\sum_{i} \frac{1}{p_i} - \sum_{i < j} \frac{1}{p_i p_j} + \sum_{i<j<k}\frac{1}{p_i p_j p_k} - \cdots + (-1)^{N+1}\frac{1}{p_1 \cdots p_N} = 1.
Contudo, podemos reescrever a soma no lado esquerdo da expressão acima como
\sum_{i} \frac{1}{p_i} - \sum_{i < j} \frac{1}{p_i p_j} + \sum_{i<j<k}\frac{1}{p_i p_j p_k} - \cdots + (-1)^{N+1}\frac{1}{p_1 \cdots p_N} = 1 - \prod_{i=1}^{N}\left( 1 - \frac{1}{p_i}\right) < 1.
O leitor pode verificar a última igualdade. A última desigualdade é óbvia, uma vez observado que o produtório acima é positivo. Portanto chegamos numa contradição, pois temos 1 < 1. \square
Uma vez que \lim_{x\to\infty} \frac{1}{x} \Big\lfloor \frac{x}{t}\Big\rfloor = \frac{1}{t}, temos que, dividindo a penúltima expressão por x e tomando x \to\infty,
\sum_{i} \frac{1}{p_i} - \sum_{i < j} \frac{1}{p_i p_j} + \sum_{i<j<k}\frac{1}{p_i p_j p_k} - \cdots + (-1)^{N+1}\frac{1}{p_1 \cdots p_N} = 1.
Contudo, podemos reescrever a soma no lado esquerdo da expressão acima como
\sum_{i} \frac{1}{p_i} - \sum_{i < j} \frac{1}{p_i p_j} + \sum_{i<j<k}\frac{1}{p_i p_j p_k} - \cdots + (-1)^{N+1}\frac{1}{p_1 \cdots p_N} = 1 - \prod_{i=1}^{N}\left( 1 - \frac{1}{p_i}\right) < 1.
O leitor pode verificar a última igualdade. A última desigualdade é óbvia, uma vez observado que o produtório acima é positivo. Portanto chegamos numa contradição, pois temos 1 < 1. \square
Uma topológica(!):
Prova 7. (Fürstenberg) Vamos definir um topologia em \mathbb{Z}. Para a,b\in\mathbb{Z},b>0, denotaremos por N_{b}(a) o conjunto \{a+nb;\;n\in\mathbb{Z}\}. Um conjunto A\subseteq \mathbb{Z} é dito aberto se for vazio ou se para todo a\in A, existe b>0 tal que N_{b}(a)\subseteq A.
Verifiquemos que isto de fato define uma topologia. Primeiro, segue da definição que \emptyset e \mathbb{Z} são abertos. Também é claro que união de abertos é ainda um conjunto aberto. Agora se A_1 e A_2 são abertos, e se a\in A_1 \cap A_2, então existem b_1,b_2>0 tais que N_{b_i}(a)\subseteq A_i, para i=1,2. Mas então N_{b_1 b_2}(a) \subseteq N_{b_i}(a), para i=1,2. Logo N_{b_1 b_2}(a) \subseteq A_1 \cap A_2. Portanto a interseção finita de abertos é ainda um aberto.
Observe que qualquer aberto não vazio nesta topologia possui infinitos elementos. Agora, podemos determinar um conjunto N_{b}(a) da seguinte maneira:
N_{b}(a) = \mathbb{Z} \setminus \bigcup_{i=1}^{b-1} N_{b}(a+i).
Portanto N_{b}(a) é o complementar de um conjunto aberto, i.e., N_{b}(a) é um conjunto fechado.
Agora voltemos para os números primos. Suponha que o conjunto dos números primos \mathbb{P} seja finito. Então
\mathbb{Z} \setminus \{-1,1\} = \bigcup_{p\in\mathbb{P}} N_{p}(0)
é um conjunto fechado, pois é a união finita de conjuntos fechados. Portanto \{-1,1\} é aberto, pois seu complementar é fechado. Mas isto é um absurdo, pois \{-1,1\} é um conjunto finito. \square
Verifiquemos que isto de fato define uma topologia. Primeiro, segue da definição que \emptyset e \mathbb{Z} são abertos. Também é claro que união de abertos é ainda um conjunto aberto. Agora se A_1 e A_2 são abertos, e se a\in A_1 \cap A_2, então existem b_1,b_2>0 tais que N_{b_i}(a)\subseteq A_i, para i=1,2. Mas então N_{b_1 b_2}(a) \subseteq N_{b_i}(a), para i=1,2. Logo N_{b_1 b_2}(a) \subseteq A_1 \cap A_2. Portanto a interseção finita de abertos é ainda um aberto.
Observe que qualquer aberto não vazio nesta topologia possui infinitos elementos. Agora, podemos determinar um conjunto N_{b}(a) da seguinte maneira:
N_{b}(a) = \mathbb{Z} \setminus \bigcup_{i=1}^{b-1} N_{b}(a+i).
Portanto N_{b}(a) é o complementar de um conjunto aberto, i.e., N_{b}(a) é um conjunto fechado.
Agora voltemos para os números primos. Suponha que o conjunto dos números primos \mathbb{P} seja finito. Então
\mathbb{Z} \setminus \{-1,1\} = \bigcup_{p\in\mathbb{P}} N_{p}(0)
é um conjunto fechado, pois é a união finita de conjuntos fechados. Portanto \{-1,1\} é aberto, pois seu complementar é fechado. Mas isto é um absurdo, pois \{-1,1\} é um conjunto finito. \square
Uma profunda:
Prova 8. (Erdős) Mostraremos algo mais forte:
\sum_{i>k} \frac{1}{p_i} < \frac{1}{2}.
Chamaremos os primos p_1,\ldots,p_k de primos pequenos; e os demais primos, de primos grandes. Dado um número natural N, seja N_{g} a quantidade de números naturais n\leq N que são múltiplos de algum primo grande e seja N_{p} quantidade de números naturais n\leq N que têm somente divisores primos pequenos (isto é, que não são múltiplo de números grandes). Então devemos ter N = N_p + N_g. Mas mostraremos que N> N_g + N_p, para N suficientemente grande.
Vamos primeiro estimar N_g. Observe que a quantidade de múltiplos de p_i menores do que ou iguais a N é exatamente \Big\lfloor \frac{N}{p_i} \Big\rfloor. Portanto,
N_g \leq \sum_{i >k} \Big\lfloor \frac{N}{p_i} \Big\rfloor \leq \sum_{i >k} \frac{N}{p_i} < \frac{N}{2}.
Agora estimemos N_p. Antes, veja que 2^k é quantidade de inteiros positivos que só possuem primos pequenos como fatores primos e são livres de quadrados (nenhum quadrado perfeito o divide). Agora, dado n \leq N, podemos escrevê-lo como n = a_n (b_n)^2, onde a_n é livre de quadrados. Além disso, como b_n \leq \sqrt{n} \leq \sqrt{N}, concluímos que existem no máximo \sqrt{N} candidatos a b_n. De modo que
N_p \leq 2^{k} \sqrt{N}.
Assim,
N = N_p + N_g < \frac{N}{2} + 2^{k} \sqrt{N}\Leftrightarrow \frac{N}{2} < 2^{k} \sqrt{N} \Leftrightarrow N < 2^{2k+2}.
Tomando N grande, por exemplo, N = 2^{2k+2}, obtemos um absurdo. \square
Outras provas.
A seguir, darei ideias de outras provas da infinitude dos números primos, as quais fica a cargo do leitor verificá-las por completo.
Matando uma mosca com várias balas de canhão.
Podemos provar a infinitude do números primos usando alguns resultados bem mais fortes. Mas, em geral, tais resultados não são fáceis de provar. Vou listar aqui alguns.
O "suficientemente grande" no teorema de Vinogradov pode ser entendido como um número maior do que 3^{3^{15}}. Em particular, o conjunto dos números primos é infinito, pois do contrário, teríamos apenas um número finito de números ímpares maiores do que 3^{3^{15}} (a quantidade de números que podem ser escrito como soma de três elementos de um conjunto de n elementos é no máximo \binom{n}{3}).
Notas:
i. Apesar da prova 1 ser atribuída a Euclides, na verdade foi Hardy quem a elaborou da maneira que está exposta. Mas trata-se apenas de uma maneira de reescrever a ideia original de Euclides que pode ser encontrada n'Os Elementos (livro IX, proposição 20).
ii. O fato da série do recíprocos dos números primos divergir, como vimos na prova de Erdős (e que Euler já sabia), está historicamente relacionado ao teorema de Green & Tao. De fato, em 1976, Erdős & Turán conjecturam que
Poste a sua solução nos comentários. Por hoje, fico por aqui. Até a próxima! ☺
Referências.
[1] Martin Aigner, Günter M. Ziegler, Karl H. Hofmann. Proofs from THE BOOK. Springer, 4th ed. 2009.
[2] Juan Pablo Pinasco. http://www.cs.umb.edu/~eb/458/final/pinasco
[3] Paulo Ribenboim. Números primos: mistérios e recordes. Coleção Matemática Universitária. IMPA, 2001.
[4] Alexander Arbieto, Carlos Matheus, Carlos Gustavo Moreira. Aspectos Ergódicos da Teoria dos Números. 26º Colóquio Brasileiro de Matemática. IMPA, 2007.
A série dos recíprocos dos números primos diverge. Em outras palavras, \sum_{p \text{ primo}} \frac{1}{p} = \infty.Seja p_1,p_2,\ldots a sequência dos números primos (possivelmente finita). Suponha que a série acima convirja. Então existe um k tal que
\sum_{i>k} \frac{1}{p_i} < \frac{1}{2}.
Chamaremos os primos p_1,\ldots,p_k de primos pequenos; e os demais primos, de primos grandes. Dado um número natural N, seja N_{g} a quantidade de números naturais n\leq N que são múltiplos de algum primo grande e seja N_{p} quantidade de números naturais n\leq N que têm somente divisores primos pequenos (isto é, que não são múltiplo de números grandes). Então devemos ter N = N_p + N_g. Mas mostraremos que N> N_g + N_p, para N suficientemente grande.
Vamos primeiro estimar N_g. Observe que a quantidade de múltiplos de p_i menores do que ou iguais a N é exatamente \Big\lfloor \frac{N}{p_i} \Big\rfloor. Portanto,
N_g \leq \sum_{i >k} \Big\lfloor \frac{N}{p_i} \Big\rfloor \leq \sum_{i >k} \frac{N}{p_i} < \frac{N}{2}.
Agora estimemos N_p. Antes, veja que 2^k é quantidade de inteiros positivos que só possuem primos pequenos como fatores primos e são livres de quadrados (nenhum quadrado perfeito o divide). Agora, dado n \leq N, podemos escrevê-lo como n = a_n (b_n)^2, onde a_n é livre de quadrados. Além disso, como b_n \leq \sqrt{n} \leq \sqrt{N}, concluímos que existem no máximo \sqrt{N} candidatos a b_n. De modo que
N_p \leq 2^{k} \sqrt{N}.
Assim,
N = N_p + N_g < \frac{N}{2} + 2^{k} \sqrt{N}\Leftrightarrow \frac{N}{2} < 2^{k} \sqrt{N} \Leftrightarrow N < 2^{2k+2}.
Tomando N grande, por exemplo, N = 2^{2k+2}, obtemos um absurdo. \square
Outras provas.
A seguir, darei ideias de outras provas da infinitude dos números primos, as quais fica a cargo do leitor verificá-las por completo.
Exercício 1. (Hermite) Seja n um inteiro positivo. Mostre que se d|(n!+1) e d>1, então d>n. Conclua que existem infinitos números primos.
Exercício 2. (Kummer) Mostre que para todo n>2 inteiro positivo, \mathrm{mdc}(n,n-1) = 1. Em particular, se n = p_1 p_2 \cdots p_k >2, então deve existir p\neq p_i, para todo i=1,\ldots,k, tal que p|(n-1). Use isto para mostrar que há infinitos números primos.
Exercício 3. (Goldbach) Os número da forma F_n = 2^{2^n}+1, para n\geq0, são chamados de números de Fermat. Mostre que a seguinte relação entre os números de Fermat é válida: \prod_{k=0}^{n-1} F_k = F_n - 2. (Sugestão: arrisque uma indução) Conclua que os números de Fermat são dois a dois primos entre si,. Ou seja, para todo m\neq n\geq0, temos \mathrm{mdc}(F_m,F_n) = 1. Conclua que devem existir infinitos números primos.
Exercício 4. (Stieltjes) Seja N um número livre de quadrados, isto é, nenhum quadrado perfeito maior do que 1 divide N. Suponha que N =mn. Mostre que se p é um número primo tal que p|N, então p\nmid (m+n). Use isto para provar a infinitude dos números primos.
Exercício 5. (Schorn) Prove que os n inteiros (n!)k+1, com k=1,\ldots,n, são dois a dois primos entre si. Use isto para concluir que existem pelo menos n números primos menores do que ou iguais a (n!)n + 1 e que, portanto, existem infinitos números primos.
Exercício 6. Seja \alpha(p,n) a maior potência de p que divide n!.
(a) Mostre que \alpha(p,n) = \Big\lfloor \frac{n}{p} \Big\rfloor + \Big\lfloor \frac{n}{p^2} \Big\rfloor + \Big\lfloor \frac{n}{p^3} \Big\rfloor + \cdots Esta expressão é conhecida como fórmula de De Polignac, mas alguns autores atribuem esta identidade a Legendre.
(b) Mostre que \alpha(p,n) < \frac{n}{p-1} \leq n.
(c) (Chebysheff) Verifique que
\sum_{p\leq n} \frac{\log{p}}{p-1} \geq \sum_{p\leq n} \alpha(p,n) \frac{\log{p}}{n} = \frac{\log{n!}}{n} >\log{n} -1,
onde o somatório acima percorre o conjunto dos números primos p\leq n. Portanto, para n\to\infty, temos que
\sum_{p \text{ primo}} \frac{\log{p}}{p-1} = \infty.
Em particular, devem existir infinitos primos.
(d) (Whang) Temos que
n! = \prod_{p \text{ primo}} p^{\alpha(p,n)}. Mostre que se existisse apenas uma quantidade finita de números primos, então
\lim_{n\to\infty} \frac{ \left(\prod_{p \text{ primo}} p\right)^{n}}{n!} = 0. Contudo, use o item (b) para concluir que o limite acima não pode ocorrer.
Matando uma mosca com várias balas de canhão.
Podemos provar a infinitude do números primos usando alguns resultados bem mais fortes. Mas, em geral, tais resultados não são fáceis de provar. Vou listar aqui alguns.
Teorema 1 (Teorema dos Números Primos). Seja \pi(x) a quantidade de números primos menores do que ou iguais a x. Temos que \lim_{x\to\infty} \frac{\pi(x)}{x/\ln(x)} = 1.Em particular, se tivéssemos uma quantidade finita de números primos, então \pi(x) seria limitada e o limite acima iria para zero.
Teorema 2 (Postulado de Bertrand). Para cada n\in\mathbb{N}, existe algum número primo p com n<p \leq 2n.Em particular, podemos determinar uma sequência de números primos p_1 < p_2 < p_3 \cdots tais que n < p_1 \leq 2n < p_2 \leq 4n < p_2 \leq 8n <\cdots
Teorema 3 (Dirichlet). Se a e b são números naturais primos entre si, então existem infinitos números primos da forma an+b, onde n é um número natural.
Para (a,b)\in\{(4,1),(4,3),(6,5)\}, não é tão difícil verificar que existem infinitos primos da forma an+b (veja este post).
Teorema 4 (Green & Tao). A sequência dos números primos p_1 < p_2 < \cdots contém progressões aritméticas arbitrariamente longas.Em outras palavras, para qualquer número natural n, podemos encontrar uma progressão aritmética de tamanho n formada somente por números primos. Observe que é impossível obtermos tal progressão aritmética de tamanho infinito.
Teorema 5 (Vinogradov). Todo número ímpar suficientemente grande pode ser escrito como soma de três números primos.
O "suficientemente grande" no teorema de Vinogradov pode ser entendido como um número maior do que 3^{3^{15}}. Em particular, o conjunto dos números primos é infinito, pois do contrário, teríamos apenas um número finito de números ímpares maiores do que 3^{3^{15}} (a quantidade de números que podem ser escrito como soma de três elementos de um conjunto de n elementos é no máximo \binom{n}{3}).
Notas:
i. Apesar da prova 1 ser atribuída a Euclides, na verdade foi Hardy quem a elaborou da maneira que está exposta. Mas trata-se apenas de uma maneira de reescrever a ideia original de Euclides que pode ser encontrada n'Os Elementos (livro IX, proposição 20).
ii. O fato da série do recíprocos dos números primos divergir, como vimos na prova de Erdős (e que Euler já sabia), está historicamente relacionado ao teorema de Green & Tao. De fato, em 1976, Erdős & Turán conjecturam que
Se A\subset\mathbb{N} é tal que \sum_{n\in A} \frac{1}{n} = \infty, então A contém progressões aritméticas de qualquer tamanho.O teorema de Green & Tao (demonstrado em 2004) mostra que quando A é o conjunto dos números primos, a conjectura é verdadeira. Contudo esta conjectura está completamente em aberto. Não se sabe nem se tais conjuntos devem conter progressões aritméticas de comprimento 3 (veja [4] para mais detalhes). Neste ponto, gostaria de oferecer como um exercício o fato de que a recíproca da conjectura é falsa:
Exercício 7. Dê um exemplo de um conjunto A\subseteq\mathbb{N} que contém progressões aritméticas de qualquer tamanho, mas que \sum_{n\in A} \frac{1}{n} < \infty.
Poste a sua solução nos comentários. Por hoje, fico por aqui. Até a próxima! ☺
Referências.
[1] Martin Aigner, Günter M. Ziegler, Karl H. Hofmann. Proofs from THE BOOK. Springer, 4th ed. 2009.
[2] Juan Pablo Pinasco. http://www.cs.umb.edu/~eb/458/final/pinasco
[3] Paulo Ribenboim. Números primos: mistérios e recordes. Coleção Matemática Universitária. IMPA, 2001.
[4] Alexander Arbieto, Carlos Matheus, Carlos Gustavo Moreira. Aspectos Ergódicos da Teoria dos Números. 26º Colóquio Brasileiro de Matemática. IMPA, 2007.
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